LEI SÁLICA
As
mulheres da família sempre
tiveram
um jeito quase póstumo
de
existir: guardar o lume
em
silêncio, comer depois de
servir
os outros, morrer primeiro.
Saíam
à hora de ponta do destino
para
lerem os caminhos perdidos
e
coleccionavam a abdicação
em
caixinhas de folha, entre bilhetes
caducados
ou dentes de infâncias alheias.
Esperavam
a vida toda por uma vida
próxima,
de alma presa a alfinetes
no
vestido preferido para o enterro,
os
passos medidos nas suas varandas
a dar
para o fim do mundo.
Retomo-lhes
às vezes os gestos
neste
meu exílio inventado,
mas
acaba aqui: vou encher de corpo
a
sombra, mesmo que nem tempo
me
reste já para a pesar.
Um Raio Ardente e Paredes Frias (Averno 057)